Na margem direita do Rio Irrawaddy, um habitante caminha em passo acelerado. Os braços descaídos ao longo do corpo imitam o movimento pendular dos membros inferiores. Indiferente à passagem do barco entre Mandalay e Bagan, em Myanmar, caminha durante 30 ou 40 metros e inverte a marcha ao chegar à zona de sombra de uma enorme árvore.
Observo-o, enquanto repete e recalca os mesmos passos uma e outra vez, uma e outra vez, uma e outra vez. Enquanto me afasto, vislumbro aquela figura humana que me parece agora em tamanho miniatura, ainda mais quando o comparo com aquela imponente criação da natureza – a enorme árvore que lhe oferece abrigo gratuito do impiedoso sol.
Desconheço os motivos desse gesto repetido. Talvez exercício físico, talvez um pré-treino militar?
Uma criança banha-se no rio, enquanto a mãe atenta observa, na margem elevada, e se assegura que não se afasta demasiado ou não é arrastada pela corrente. Ao lado, uma outra mulher lava um pano preto e sacode-o para remover o resto de pó.
Dois bois aguardam pacientemente que o dono acabe de carregar, com areia do rio, a carroça para depois a transportar para a aldeia a poucos metros de distância. Um pouco mais ao lado, duas mulheres revolvem a terra com firmeza, junto à margem, para dar lugar a novos cultivos.
Acenam, primeiro, à minha passagem e passam, depois, um lenço na testa para limpar o suor da árdua tarefa agrícola. Ainda o ponteiro do relógio não tocou nas onze da manhã e o calor já é insuportável.
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Fé budista, descrença no cruzeiro do Rio Irrawaddy
Sigo a bordo desta embarcação turística, com destino a uma das zonas mais bonitas de Myanmar – a cidade de Bagan, com os seus múltiplos templos. O MGRG Express desliza pelas calmas águas do rio, dizendo adeus a pagodas que preenchem a paisagem. A cada par de quilómetros uma outra pagoda surge no horizonte.
A fé budista não deixa nada ao acaso e o símbolo desta crença está bem vincado neste país do Sudoeste da Ásia.
O capitão do barco, que vejo de olhar vincado no horizonte, move o leme com cuidado para tornear os bancos de areia do Rio Irrawaddy. É época seca e a navegação é mais perigosa neste percurso de barco entre Mandalay e Bagan, em Myanmar.
Os barcos públicos deixam em alguns casos de conseguir efetuar o percurso. Apenas as embarcações turísticas parecem conseguir manter o caminho aberto todo o ano. Um assistente aponta para a esquerda e o capitão de imediato manobra o leme. Sinto uma pequena mudança na direcção. Sigo eu, e seis dezenas de outros passageiros, mais ao meio do rio, onde o caudal é ainda um pouco mais elevado.
Cansado de ver grupos de turistas a acotovelar-se — para fotografar cada pagoda que as copas das árvores ocultam e vislumbram a cada curva do leito do rio — decido descer ao piso inferior do barco. Ainda faltam muitas horas para chegar a Bagan e o local que agora ocupo, numa das zonas laterais do barco, é perfeito.
As portas do barco estão abertas e, quase tocando com os pés na água do rio, relaxo num pequeno espaço, deitado sobre um tapete de borracha esverdeado. Decido que esta será a minha “suite” privada até ao final da viagem por este longo rio birmanês.
Aqui, apenas oiço o oscilar do rio e o suave ruído do barco a embater na água acastanhada. Sinto o seu cheiro, vejo-o a uma distância curta, quiçá demasiado curta. Se me esticasse conseguiria, por certo, tocar-lhe. Mesmo assim, agradeço os salpicos que me refrescam em intervalos indefinidos. Prefiro esta perspectiva de maior proximidade e incrível serenidade do Rio Irrawaddy.
Vidas presas pela rápida erosão
Em terra pouco firme, dezenas de mulheres caminham agora, de cestos carregados às costas, na mesma direcção. Estou tão distraído a observar esse movimento em uníssono que quase ignoro a chegada de outra viajante à “minha suite privada”. Ao vê-la, sorrio.
Pergunta-me se pode juntar-se a mim neste espaço lateral do barco. Digo que sim, claro. Seguimos sem falar, apenas observando o cenário natural e humano que desliza ante os nossos olhos. Por vezes paisagens monótonas, outras vezes mais exuberantes.
Somos perturbados por uma súbita mudança na direcção e pelo lançamento à água de um pau com vários metros. Trata-se de um dos assistentes do capitão a medir a profundidade do leito do rio.
Repete o gesto por três vezes. “Não há problema”, grita para o capitão. Esta é uma tarefa vital nesta viagem de barco entre Mandalay e Bagan, pois é comum algumas embarcações ficarem encalhadas nos bancos de areia do Irrawaddy.
Por momentos, margens de areia reflectem o sol, noutros locais esses raios são absorvidos pelas zonas de cultivo. Mas choca-me a dimensão da erosão nas margens do Rio Irrawaddy. Esta erosão das margens dos rios, em Myanmar, está aliás a transformar-se num grande desafio para o desenvolvimento rural do país.
Muitos agricultores estão em vias de perder o seu meio de subsistência. De acordo com os responsáveis birmaneses, a erosão das margens dos rios, em 2017, aumentou de forma substancial em relação ao ano anterior.
O Plano de Acção de Myanmar sobre Redução do Risco de Desastres salienta mesmo que a erosão das margens dos rios é um dos maiores desafios que o país enfrenta. Entre 2014 e 2017, 261 pessoas perderam a vida devido à erosão das margens. No ano passado, quase 170 casas e uma escola secundária foram realocadas devido à erosão das margens do Rio Irrawaddy.
O chef Italiano e a etnia Rohingya antes de chegar a Bagan
No piso superior, em largas cadeiras de bunho, os viajantes devoram livros, jornais e revistas, jogam às cartas ou apenas colocam o sono em dia. “É o dia da preguiça”, exclama um jovem para o companheiro de aventura.
Viajar em Myanmar é exigente, nem sempre se conseguem executar os planos de férias. Acredite que, se alguma vez conduziu ou viajou a bordo de um veículo nas estradas da Birmânia, este passeio fluvial entre Mandalay e Bagan é dos momentos mais relaxantes que vai encontrar.
Durante mais de uma hora troco experiências de viagem (e dicas de culinária) com um chef de um restaurante do Norte de Itália. Ele, como eu, está pela primeira vez na Ásia. Mas tem mais sorte do que eu, que viajo com o plano desenhado ao pormenor e sem margem para desvios.
Este chef aproveitou a pausa de Inverno em Itália para viajar durante três meses para esta região do planeta. Conta-me que começou pelo Cambodja, tendo depois seguido para os vizinhos Vietname e Laos e só iria terminar mais a sul, na Tailândia.
Claro que falamos de comida e diz-me que prefere a comida de Myanmar ao Vietname, por ser mais consistente e mais temperada, talvez mais adocicada. Aproveito para lhe sugerir o restaurante onde melhor comi em Myanmar: Sim Yaw no Lago Inle ou Inle Lake.
Quando visito Myanmar, a crise em redor da etnia Rohingya está no auge das notícias internacionais. Na antiga Birmânia, ninguém menciona nem por breves momentos, este grave problema.
O chef italiano diz-me não conseguir compreender como é que neste país – com um povo tão gentil e acolhedor – tal situação possa estar a suceder. “É claramente, um genocídio”, afirma convicto.
Nota: Utilizo, de forma intencional, ambas as designações Birmânia e Myanmar para me referir ao país asiático. Myanmar é o nome oficial do país, mas o nome foi introduzido de forma unilateral – sem consulta ao povo birmanês – pela ditadura militar, e ainda é rejeitado por uma grande parte da população. Espreite também o roteiro de viagem a Myanmar.
Informação extra
Como escolher o barco entre Mandalay e Bagan?
Existem várias empresas que fazem o percurso fluvial no Rio Irrawaddy entre Mandalay e Bagan (e vice-versa). Eu viajei com a MGRG Express e a única razão de queixa que tenho é que não houve café e chá durante todo o percurso, como era publicitado. De resto, uma viagem perfeitamente relaxante de barco entre Mandalay e Bagan.
Os passeios de barco podem ser feitos por embarcações mais lentas, que são usadas pelos moradores locais e geralmente custam entre 10 e 20 dólares.
Estes barcos mais lentos são menos fiáveis, as viagens demoram muitas vezes mais do que é sugerido e podem ficar encalhados nos bancos de areia. Existem vantagens: poupa dinheiro e partilha o barco com cidadãos locais.
Além disso, existem cruzeiros muito mais caros, com cabine de luxo e serviço cinco estrelas – estes têm de ser reservados com antecedência através de um agente de viagens.
Quanto custa e onde comprar o bilhete?
O preço do bilhete do barco (42 dólares) entre Mandalay e Bagan é mais elevado do que no sentido inverso (32 dólares). Em Mandalay, comprei o bilhete do MGRG Express no posto turístico da Estação Central de Comboios, mas em qualquer unidade hoteleira poderá adquiri-lo ou obter informação sobre qual o local onde comprá-lo.
Alguns hotéis cobram comissão, mas a maioria não o faz. É conveniente comprar o bilhete com alguma antecedência (um par de dias), para garantir o seu lugar.
Quanto tempo demora a viagem
A viagem de barco demora cerca de nove horas entre Mandalay e Bagan, viajando num ritmo lento e agradável. Se fizer a viagem no sentido inverso, entre Bagan e Mandalay, subindo o Rio Irrawaddy, então deverá demorar cerca de 11 horas. No meu caso, a viagem demorou cerca de oito horas, entre Mandalay e Bagan.
Barco Mandalay – Bagan
De Mandalay, o barco parte do cais MGRG, localizado na Myo Part Street. O horário de check-in é às 6h30, para partir às 7h00. A chegada a Bagan é entre as 16h00 e 17h00 – timing perfeito para ainda assistir ao pôr-do-sol em Bagan.
Barco Bagan – Mandalay
De Bagan, o barco parte de Nyaung Oo. O horário de check-in é às 5h00, para largar amarras às 5h30. Se tudo correr como previsto o barco chegará a Mandalay entre as 17h00 e as 17h30.
O que está incluído?
O que é oferecido pode variar um pouco, mas normalmente o pequeno-almoço (croissant, fruta e ovo cozido) e almoço (arroz ou noodles e vegetais) estão incluídos, além de café, chá e água. A quantidade não é muita, pelo que aconselho levar alguns snacks consigo e talvez um pouco mais de água.
O que precisa levar para o barco?
Acredito que se vai fazer este percurso irá levar toda a sua bagagem, por isso tome note que a entrada no barco pode ser um pequeno problema, já que é efectuada através de estreitas tábuas de madeira. De resto, pode levar água, óculos de sol, protector solar, chapéu, e uma camisola ou casaco para as primeiras horas de viagem.
Existe casa de banho a bordo, mas nem sempre – dizem alguns relatos – tem papel higiénico. Por prudência, leve um rolo consigo. Claro que vai querer levar máquina fotográfica e as baterias carregadas. E assegure-se de que a sua bagagem tem um cadeado, pois todas as malas ficam “esquecidas” no corredor do barco e ao fácil alcance de mãos alheias.
Dica para a chegada a Bagan
À chegada ao cais em Nova Bagan, irá encontrar uma imensidão de taxistas que não vão perder tempo a tentar convencê-lo a entrar num dos veículos. A verdade é que vai precisar de táxi, mas não ceda à primeira e evite as carroças porque o caminho é longo.
Se possível, tente ser dos primeiros a sair do barco para ter mais folga na negociação, já que depois irá ficar a mercê dos preços que os taxistas desejam praticar.
Eu bati o pé por 10 minutos para tentar encontrar um taxista que estivesse disposto a reduzir o preço. Inicialmente pediram-me 20 dólares para fazer um percurso de cinco minutos. Acabei por pagar dez dólares e isso incluiu o transporte do cais para a zona dos templos de Bagan, o tempo de espera para assistir ao pôr-do-sol desse dia e o transporte para o hotel.
Recomendo, se fizer esta viagem entre Mandalay e Bagan, que siga de imediato para os templos e só depois para o hotel. Não se preocupe com a bagagem que Bagan é uma cidade segura e o taxista irá assegurar-se que nada acontece com a bagagem – mas pague a viagem só no final.
Dinheiro em Myanmar
Kyat (pronunciado “tchat“) é a moeda oficial de Myanmar e só consegue está disponível no país. A moeda preferida de troca é o dólar, mas eu aconselho a viajar com este cartão que lhe vai poupar imenso dinheiro.
Visto para a Birmânia / Myanmar
Ao contrário de anteriormente, pode solicitar o visto para a Birmânia online e este deverá estar pronto no prazo três dias úteis. O visto é válido por três meses e pode permanecer no país por um período máximo de 28 dias. O custo para o visto de Myanmar é de 50 dólares (2018).
Como chegar a Mandalay
Não existem voos directos de Portugal para Myanmar. De Lisboa, pode voar para a Birmânia com a Emirates por cerca de 700€. Outra opção é voar de Lisboa para Banguecoque e daí apanhar um voo low cost para Mandalay.
Voar para Yangon é bem mais barato do que voar para Mandalay. Simule o preço para ambas as cidades principais de Myanmar e veja também o custo de voos internos entre Yangon e Mandalay. Utilize a Skyscanner para comparar as diversas opções e preços.
Eu voei a partir de Londres, com a Qatar Airways e recomendo este percurso, já que a viagem é repartida de forma equilibrada, com paragem em Doha, no Qatar. De Londres existem também soluções mais económicas com a Air China (500€), embora envolvendo voos bem mais longos.
Alugar um carro
Se tiver viatura própria é muito mais fácil. Opte por alugar um carro com a Discovercars. Este site permite comparar os preços e, em muitos casos, pode-se cancelar o aluguer sem custos até 48h antes da partida.
Segurança em Myanmar
Myanmar é um país seguro e a população é muito simpática. Veja informação actualizada sobre a segurança em Myanmar. Em Mandalay, o principal perigo é o ruído e a poluição, já que o trânsito é caótico. E negociar com os taxistas é Mandalay é quase tarefa impossível.
Onde ficar em Mandalay
Durante a minha estadia em Mandalay fiquei alojado no Hotel 8. Recomendo o hotel – sobretudo pelo staff, sempre atento e pronto a ajudar, a sugerir restaurantes e até a fazer a marcação de bilhetes de autocarro. O hotel é confortável – embora alguns quartos sejam melhores que outros – e fica perto da estação de comboios.
Se ficar hospedado no último piso irá ter uma vista melhor, mas ficará mais perto da sala de refeições, o que pode ser um inconveniente se quiser dormir até mais tarde. O pequeno-almoço está incluído e é aceitável.
Onde ficar em Bagan
Eu fiquei alojado no Sky View Hotel e recomendo. O pequeno-almoço (incluído) no hotel é bom e servido no terraço com uma óptima vista, ao nascer do sol. As refeições principais também são boas e com um preço aceitável.
Os quartos são confortáveis, mas escolha um quarto com vista, já que existem quartos no piso -1 onde a única vista que vai ter é uma parede. Esses quartos nos pisos superiores vão custar-lhe um pouco mais, mas acredite que é dinheiro bem investido.
Seguro de viagem
Nunca viaje sem seguro de viagem. Recomendo a IATI Seguros ou a Heymondo (ao usar qualquer um destes links tem 5% de desconto). São os melhores seguros de viagem (e os mais baratos) e têm protecção Covid-19.
Sempre que quiser marcar um voo, um hotel ou comprar seguro de viagem, use as plataformas que eu recomendo e confio. Só tem de clicar nos links abaixo antes de pesquisar as suas viagens.
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Organizo e lidero viagens em grupo para destinos que conheço bem. E só faço viagens com pequenos grupos (máximo de 12 pessoas).
Já estive em 60 países, por isso se tiver uma viagem em mente com um grupo de amigos, familiares ou colegas de trabalho, contacte-me e terei todo o prazer em planear, organizar e liderar a viagem que deseja. O roteiro poderá ser desenhado à medida, assim como o orçamento e actividades.
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