Sexta-feira. Faltam 11 segundos para a meia-noite, mas o movimento é incessante, como se houvesse aqui hora de ponta. Todavia, não há carros, motos ou qualquer outro tipo de transporte. E, principalmente, não há comboio na derradeira fronteira. Restar-me-ia seguir a pé, nos últimos metros, até Macau.
A distância é curta – só teria de caminhar desde a estação de comboio até ao posto fronteiriço. Apesar de ter viajado milhares de quilómetros nos últimos meses e de ter experimentado quase todo o tipo de composições, até esta última viagem de comboio, a derradeira, entre Guangzhou e Zhuhai foi diferente: fá-la-ia de pé.
O único tipo de bilhete disponível era “standing”, mas queria entrar nesse dia – ou noite – em Macau. Corria contra o tempo, a fronteira iria encerrar dentro de pouco tempo. Iria, por isso, ter de percorrer este último troço da minha aventura De Portugal a Macau – como se estivesse a viajar num Metro ou eléctrico citadino. Era a única opção. Não me restava alternativa.
Faço-o, mas não estou sozinho. Sou apenas um entre muitos, de pé, no penúltimo comboio do dia. Para mim, era, porém, o último comboio de uma vida. Ou desta parte da vida, desta viagem de longa duração. Não importava como viajava: sentado, deitado ou de pé. Era preciso lá chegar – e de comboio.
Milhares acorrem ao posto fronteiriço. O cartão de identidade é o único documento que necessitam para atravessar da China continental para Macau. Esse pedaço de sonho que os Portugueses mantiveram durante décadas e que dentro de pouco anos irá desfazer-se por completo com a transição para domínio chinês.
Ainda que, para nós portugueses, pareça estranho falar de Macau como uma região da China. Ainda que em Macau nos refiramos à China como um corpo estranho ou que digamos – eu próprio – que vamos à China, como se Macau fosse quase um país independente. “Vamos à China” ou “Vim agora da China” podia dizer-se quando se atravessam as Portas do Cerco (ou Gongbei) para um lado ou para o outro.
Preparo-me assim para chegar a Macau, a pé. Na verdade, cheguei à fronteira de Macau de comboio e só teria de caminhar um par de quilómetros ou talvez menos para finalmente pisar solo macaense. Perdão! Para pisar a calçada portuguesa de Macau ou a calçada macaense.
Há exactamente seis meses – no mesmo dia do mês em que chegaria a Macau – havia partido da calçada portuguesa, em Portugal. Quase apetece dizer que não saí do mesmo sítio. Seria impossível, porém, afirmá-lo, pois na rota que me levaria a Macau houve inúmeras histórias contadas e, sobretudo, vividas.
Não me sinto aliviado. Não sei, ainda hoje quando releio este texto, o que sentiria ao chegar a Macau. Dever ou missão cumprida? Talvez. Sonho alcançado? Sem dúvida. Tristeza por já ter terminado? Claro, que sim. Felicidade por ter chegado a Macau? Absolutamente.
Paro uns segundos para contemplação. Não contemplo o que vejo ao meu redor, dos gestos e palavras repetitivas que aqueles homens e mulheres, os guardas da fronteira de Gongbei – dia e noite – executam em mandarim, num inglês rudimentar e, provavelmente, nunca em português. Ignoro até os milhares que marcham, num frenesim imparável, mas sem estarem alinhados, até ao outro lado da fronteira.
Contemplo, por instantes, na minha memória certamente, os milhares de quilómetros que percorri em linhas férreas – das montanhas geladas da Áustria e Eslovénia, aos campos cultivados da Bulgária ou da Turquia. Da paisagem marítima da Rússia, ao deserto do Cazaquistão.
Das dezenas de pessoas que comigo falaram, dos vários novos amigos que fiz e com quem partilhei a estrada por várias semanas como se já fôssemos companheiros há anos. Saboreio, também ainda minha memória, as dezenas de refeições e bebidas que tomei: da chacha e khachapuri da Geórgia, dos kebab turcos ao peixe com cerveja de Xingping ou Yangshuo.
Em seis segundos (ou pouco mais) passam-me pela memória seis meses de uma grande viagem. Do momento em entrei no primeiro comboio em Portugal, até este exacto segundo em que já, quase, sinto o cheiro da culinária macaense e em que estou a chegar ao destino final desta odisseia: De Portugal a Macau.
Despeço-me da China, depois de 30 dias intensos na grande potência mundial, o país que mais surpreendeu numa rota de seis meses em que atravessei quase duas dezenas de nações.
Recebo do guarda-fronteiriço o pequeno pedaço de papel branco que me autoriza a deixar a China para entrar no mundo de sonho, ilusão e história.
Macau, cheguei. Aliás – mais correctamente – cheguei a Macau!
De Portugal a Macau – crónica #26
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