Extensos campos de papoilas e uma paisagem verdejante de Primavera trazem de imediato à minha mente o paralelo paisagístico com as planícies do Alentejo. Talvez a mente nos faça sempre viajar até ao que nos é mais próximo ou mais reconhecido.
Não pára, todavia, por aqui, pois nas terras castanhas vejo agricultores e pequenos produtores. Alguns curvados, outros que fazem uma pausa nessa dura postura para ver passar o Pamukkale Express.
O Pamukkale Express viaja entre Eskişehir e Denizli – a poucos quilómetros de Pamukkale. O comboio percorre 421 km, ao longo de quase oito horas, no centro da Anatólia turca.
Duvido que estes homens e mulheres – que ali trabalham árduas horas a fio – saibam que dessa forma se denomina a viagem de comboio que liga Eskisehir à cidade de Denizli. Um nome que, tal como outras ligações (Sud Express ou Transiberiano), serve para facilitar a promoção turística interna e, principalmente, externa de um lugar.
Numa paragem, cujo nome não memorizei, um homem, que aparenta ter 60 e poucos anos, sai do comboio directamente para a linha férrea, quase não esperando que o motorista tivesse totalmente freado o comboio. De mala preta na mão por ali caminha, sem hesitação.
Quase em imitação, uma mulher, de bengala, ajoelha-se primeiro, e depois lentamente rodopia para assim conseguir pular o contínuo e alto bloco de cimento que divide as duas linhas férreas.
Enquanto estes movimentos ocorrem, um jovem foge para a plataforma para conseguir, em tempo recorde, comprar dois gelados, regressar ao comboio e ainda seguir viagem.
Estas e outras pessoas atravessam linhas férreas desactivadas e outras em funcionamento, porque é a forma mais fácil e cómoda de chegar ao outro lado de qualquer povoação em zonas menos povoadas da Turquia.
Mais à frente, um burro atravessa-se na estrada, indiferente aos carros que por ela passam. Talvez não se aperceba ou não seja suficientemente inteligente para ver o perigo que corre.
As estradas estão em óptimo estado, mas vejo poucos carros nesta região da Turquia entre Eskişehir e Pamukkale. Ao contrário das grandes cidades – onde milhares de pessoas vivem em espaços cada vez mais apertados e onde a falta de paciência ao volante é evidente, assim como a inexistência de autoridade das forças policiais para vigiar e punir os constantes atropelos ao código da estrada.
Da janela, vejo minaretes azuis e verdes que competem com torres de telecomunicação. Uma mãe puxa o filho por uma plantação de lavanda (ou alfazema), nas imediações de uma das inúmeras estações e apeadeiros ao longo do percurso do Pamukkale Express.
Aí, uma carruagem modelo, com décadas de existência, foi cuidadosamente restaurada, pintada, simbolizando a importância da linha férrea no passado e presente da Turquia.
Perante o que observo, bem poderia estar no Alentejo de há décadas: em dias quentes as mulheres trabalham nos campos agrícolas de lenço na cabeça. Mas a bandeira vermelha, com uma estrela e meia lua branca, hasteada num planalto, dissipa todas as dúvidas. Aliás, há bandeiras nas janelas, nas estações e erigidas no alto de montes e colinas por onde quer que viaje.
Uma manada de vacas arrisca descer um acesso íngreme. Levanta-se pó e atropelam-se para chegar à água: é uma espécie de mini-serengeti da Turquia.
Nesse fabuloso parque da Tanzânia, manadas de zebras e gnus atropelam-se para chegar à água fresca, atravessá-la em busca de melhores pastagens e arrefecer do imenso calor da estepe africana. Pelo menos ali, nesta poça de água turca, as vacas não vão encontrar crocodilos esfomeados.
Repetidamente, qualquer que seja o tamanho da povoação em questão, multiplicam-se os minaretes. Numa dessas, quase conto pelos dedos das mãos o número de habitações, mas identifico cinco mesquitas. À medida que me dirijo para Este, na Turquia, o Islamismo torna-se mais evidente nas camadas da população.
Ao meu lado, quero dizer na fila do lado – porque homens e mulheres não podem viajar ao lado de pessoas do sexo oposto – viaja uma mulher com o filho e vai lendo o Corão.
Comprar bilhetes no banco do lado se já estiver ocupado por uma pessoa do sexo oposto não é possível na Turquia – de todo. Ao tentar reservar bilhetes para o comboio ou autocarro, há bonecos representativos do sexo masculino e feminino e o sistema simplesmente não permite fazê-lo – mesmo que haja lugares vazios. A única excepção é se comprarem bilhetes em simultâneo.
Aquela mulher lê o Corão e vai mexendo os lábios, enquanto com olhos, segue as linhas do livro – da direita para a esquerda, em árabe. O pequeno livro está envolto numa capa de pele castanha.
O filho, arrisco de 10 anos, está mais interessado nas fotos da paisagem que vou tirando. Primeiro planícies, seguindo-se planaltos e finalmente terrenos que guiam o olhar até altas montanhas. Até que se cansa do que faço e pede ao pai – que está sentado com o irmão nuns bancos mais à frente – um livro de banda desenhada.
Enquanto esta criança lê atentamente as histórias, ocorre-me pensar que talvez seja já raro ver miúdos desta idade, mais velhos ou mais novos a ler um livro e mais do que isso – a preferir um livro a um telemóvel ou tablet com jogos.
Uns bancos mais adiante, aquele jovem recordista da compra dos gelados em menor tempo possível, beija a namorada, interrompendo a sua leitura de um livro de Dostoyevsky. Sem querer ainda saber como termina essa obra do autor, a jovem deixa-se acariciar, abraçar e beijar.
O contraste não podia ser maior num espaço tão pequeno. Na fila 18, o conservadorismo de uma mulher de 40 anos, na fila 20, a irreverência de uma jovem de 20 e poucos.
Não poderia encontrar exemplo mais evidente da sociedade turca. Neste país, a religião muçulmana é maioritária, mas dispensa a restrição de outros países vizinhos. Segui também eu apaixonado pela beleza natural das paisagens até aos Castelos de Algodão de Pamukkale. Sem restrições.
De Portugal a Macau – crónica #7
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