Avisto um monte branco de dimensão absurda. Ao longe parece uma montanha coberta de neve, talvez gelo. Talvez seja uma rocha branca, talvez sal ou um enorme stock de algodão.
Quando me aproximo, no Pamukkale Express – o comboio que viaja entre Eskişehir e Denizli, vejo-o entre os vagões parados na linha férrea, mas as árvores tapam-me a visão por momentos. A poderosa luz que irradia, mesmo ao final do dia, é quase surreal.
“C’est magnifique”, disse-me a proprietária do hotel onde fiquei hospedado em Eskişehir. Em francês, porque foi esta a forma de comunicarmos durante a minha estadia nesta cidade da Turquia. Eu sem falar turco, ela sem compreender inglês. O meu francês enferrujado deu para uns minutos de conversa por dia.
Já tinha visto inúmeras fotos de Pamukkale ao nascer, ao pôr-do-sol e a qualquer outra hora. E, claro, muitas outras fotografias que até já chegam a causar náuseas de tanta repetição, tanta falta de criatividade. De turistas vestidas de cores berrantes: vermelho, verde, azul, para forçarem, forjarem poses para publicar no Instagram.
É uma montanha de gente. Ao longe ou vistos dos balões de ar quente (com o som dos quais despertei nessa manhã em Pamukkale) talvez pareçam formigas numa montanha de sal.
Com uma perna estendida, com um braço sob a cabeça, com o cabelo sobre os ombros, de vestido aberto e uma perna à frente da outra para reforçar as linhas do corpo feminino. Sei isto tudo, das minhas lides de fotógrafo, mas o que era antes reservado aos fotógrafos, artistas, modelos profissionais é agora utilizado (e abusado) em qualquer local turístico.
Durante 10 ou 11 horas, vejo, revejo, canso-me de ver jovens e menos jovens a fazer estes movimentos nas piscinas termais de calcário de Pamukkale. Uma jovem de baixa estatura vai a dar indicações ao namorado que a fotografa de frente, de perfil, de costas.
Primeiro em biquini, depois envergando um longo vestido colorido. Ela mergulha nas piscinas de Pamukkale, enquanto o namorado, fora de água, de rosto e pele avermelhados lá vai respondendo às exigências da companheira – apesar dos mais de 30 graus de temperatura que assolam Pamukkale.
Acedo a estas fantásticas piscinais pela entrada mais próxima da povoação, pois é o local oposto à chegada dos autocarros carregados de turistas: invariavelmente de origem asiática ou russa, mas também americanos.
Na noite anterior, havia-me deslocado ao portão do recinto para saber o horário de abertura de Pamukkale, mas fui despachado com celeridade pela segurança de serviço.
Estava (demasiado) ocupada a falar ao telefone para me dar atenção, por isso não soube – até ao dia seguinte – que o portão norte tinha um horário distinto – abria às 6h30, enquanto a porta onde me encontrava só abriria às 8h00. E, assim, quando entrei em Pamukkale, já perto das 8h30 da manhã já tinham chegado centenas de pessoas.
Subi, passo a passo, por um terreno áspero, duro e acidentado, tortuoso até. E, como mandam as regras de acesso, só é possível aceder a Pamukkale com o calçado com que surgimos ao mundo – a pele dos pés. Descubro que o significado de Pamukkale é “Castelo de Algodão”. Esta proibição tem, por trás, um bom motivo: o calçado foi interdito para evitar danos neste Património Mundial da Humanidade (inscrito em 1988).
Fiz a pesquisa, mas os horários mudam regularmente e tudo, por vezes na Turquia, parece abrir quando abre e fechar quando fecha.
Num dos dias seguintes, nem os próprios seguranças sabiam que nos feriados da Turquia — no Eid al-Fitr a celebração muçulmana que marca o fim do jejum do Ramadão — estaria fechado até às 13h00. Perante isto, consolo-me com o meu desconhecimento em relação ao horário de abertura de Pamukkale.
Pamukkale estende-se por vários quilómetros. De um lado, planícies cultivadas, algumas já secas pelo sol quente da meia-estação. Do outro lado, montanhas altas em que os picos ainda preservam pedaços de neve mais resistente. No plano intermédio, colinas de média dimensão, como cogumelos sobrepostos, antes da vista alcançar os prédios da cidade de Denizli, a capital da província da região do Egeu, no sopé da montanha.
Escondo-me do sol sufocante na sombra de uma esculpida e gigante parede de calcário, enquanto centenas ou milhares desfilam pela passadeira branca de Pamukkale.
Cerca de 5 mil pessoas visitam este magnífico local, repetindo este ritual: descer até às primeiras piscinas, concentrar-se por alguns minutos até terem satisfeito todas as poses e falsos sorrisos e partindo 15 minutos depois para qualquer outro local que os guias turísticos lhes indiquem.
É uma montanha de gente. Ao longe ou vistos dos balões de ar quente (com o som dos quais despertei nessa manhã em Pamukkale) talvez pareçam formigas numa montanha de sal.
Essa geração egocêntrica, “instagrâmica” parece até ignorar a beleza ímpar de onde está. Um dos visitantes expressa o seu desagrado para com este individualismo geracional. Na sua t-shirt, ao peito, lê-se “FCUK your selfie”. No início das redes sociais, quem viajava fotografava os locais por onde passava para mostrar aos amigos.
Agora fotografam-se a eles próprios para mostrarem aos amigos, talvez em reuniões de família, passando foto atrás de foto com o dedo no telemóvel. Talvez com essas imagens se pudesse jogar aquele jogo que, há anos, foi muito popular em cafés de todo o país “Descubra as diferenças”. É fácil ficar cego pelo branco de Pamukkale e ignorar tudo o que rodeia este magnífico local.
“Pamukkale é pôr-do-sol, Capadócia é nascer-do-sol”, diz-me o homem que gere o hotel onde fiquei alojado nesta viagem de Portugal a Macau. Ele próprio um ex-guia turístico, dá-me estas dicas. Bem sei que assim é, mas é essa a única ou quase única forma de conseguir paz e silêncio em Pamukkale, de apreciar o que a natureza criou e o homem transformou.
O meu pensamento e visão oscilam entre o branco de Pamukkale, o dourado das colinas e campos planos e o castanho das montanhas. Afasto-me da multidão e percorro quilómetros para ver todos os cantos deste local tão especial.
Visito também os espaços arqueológicos da antiga cidade de Hierápolis. A beleza de Pamukkale é disputada de todos os prismas que se observa. In loco, ao longe, do ar.
Partilhar essa beleza arrepiante com milhares de outros visitantes é o único inconveniente, por isso sou o último a sair de Pamukkale, 12 horas depois, com os pés doloridos de tanto caminhar. Saio de alma cheia, à luz das estrelas, dos enormes holofotes e de uma lanterna móvel.
Lentamente, vou deixando para trás este castelo que se diz ser de algodão. Embora tenha falhado o nascer do sol, fui brindado com um dos melhores anoiteceres a que já assisti. Senti a paz que Pamukkale irradia, acompanhado de alguma luz, do som constante da água a percorrer o calcário, enquanto lentamente cria novas formas.
Despeço-me da segurança. Sou o último a abandonar o recinto de Pamukkale, mas da próxima vez, gostaria de ser o primeiro… a chegar.
De Portugal a Macau – crónica #8
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