80 anos de idade. Quiçá rejuvenescidos por uma vida de prazeres, vida relaxada, boa comida e vinho, vários homens circulam pelas ruas de San Sebastián – compõem uma cuadrilha. Encontro-os no início do passeio pela cidade.
Este é um fenómeno cultural típico do País Basco e Navarra, caracterizando-se por um grupo de amigos que, desde jovens, mantiveram uma forte amizade que se estende até à idade adulta e, em muitos casos, até ao final da vida.
É algo inspirador e também sei do que se trata, pois também em Portugal faço parte de uma dessas cuadrilhas. Ou seja de um grupo de amigos que se mantém desde tenra idade e que se junta diversas vezes por ano. Se ainda vou ter energia aos 80 anos, como este grupo de homens, já não sei dizer.
Acompanhado pela minha guia, Maria, paramos no primeiro “posto de abastecimento” de pintxos e um dos mais populares da cidade – Borda Berri. Maria alerta-me para este grupo de homens, enquanto me explica de forma breve o conceito destes grupos de pessoas.
Apenas existe um “problema”, que iríamos descobrir minutos depois. Vieram de minibus desde os arredores de Bilbau e percorrem as ruas de San Sebastián, de bar em bar, de copo na mão. E todos, ou quase todos, sabem da rivalidade entre Bilbau e San Sebastián.
Tendo já visitado ambas, prefiro, sem dúvidas, San Sebastián. Donostia é uma cidade onde se vive, come e bebe bem, com uma atmosfera mais relaxada e uma paisagem encantadora em redor do aglomerado urbano.
Bilbau tem a arte e arquitectura do Guggenheim, enquanto Donostia – o nome como é conhecida San Sebastián na língua basca – tem gastronomia de requinte, boa gente, boa vida, bom peixe e “honestidade”.
800 euros por uma iguaria basca
É comum chegar a um bar, pedir uma bebida, tirar os pintxos que nos apetece e, no final, dizer ao empregado quantos provou e pagar a conta. Porque a honestidade é um dos pontos vitais da sociedade donostiarra.
No entanto, com o crescimento do turismo, alguns bares tiveram de deixar de o fazer pois talvez fosse impossível manter algum controlo. Isso foi algo que irritou os habitantes da cidade, habituados a provar pintxos de forma relaxada e apenas pegar na carteira no final da refeição.
O fim deste procedimento foi, aliás, visível quando acompanhado pela minha guia nos foi solicitado que tudo fosse pago de imediato. De facto seria mais confortável estar por ali provando pintxos, um atrás de outro, acompanhados de uma buena copa de vino.
A cozinha basca tem a fama e, felizmente, mais que a fama. Temos nós, os visitantes, o proveito. É preciso, porém, dinheiro, pois San Sebastián está longe de ser um destino de viagem para massas e para quem tem bolsos poucos fundos.
Donostia é uma das cidades mais caras de Espanha e surge, em diversos estudos do género, à frente de Barcelona ou Madrid.
E se há um sítio de San Sebastián onde isso se torna óbvio é no mercado do peixe e nos restaurantes. Encontro percebes a 75€/kg, no mercado, chegando a 150€/kg no menu de restaurantes da cidade. Outros exemplos: rodovalho a 29€/kg no mercado e 60€/kg no restaurante.
O cúmulo dos preços atinge-se, no entanto, com as mini-enguias, um elixir da cozinha basca. No dia que visito dois dos mercados da cidade não estão à venda. Desconheço se isso se deve à falta de enguias para vender ou se já todas teriam sido vendidas nessa ocasião.
Em dias “bons”, o preço é de 500€/kg, embora o mais comum seja encontrar preços a rondar 800€/kg. No restaurante o preço é… incalculável?
Do peixe ao remo no porto de San Sebastián
No porto de San Sebastián, outrora chegavam barcos carregados de peixe e marisco. Ali ao lado, ainda existe uma das primeiras peixarias da região.
O letreiro diz tudo “Cocedero de mariscos”. Metros ao lado, nos prédios com fachada de azulejo acastanhado, um homem e uma mulher espreitam pelas janelas de madeira verdes, abertas para deixar entrar o calor do dia. Aparentam ter alguma ligação à actividade pesqueira.
As águas do porto são agora ocupadas por pequenos barcos de recreio e neste dia, em que visito San Sebastián, por botes de Orio. Tratam-se de longas embarcações de madeira a remo, que podem levar vários remadores e cuja competição é feroz na Baía de La Concha.
Vestidos com as cores da região – amarelo, verde, azul, mulheres e homens aquecem, primeiro, os membros superiores. Em movimentos giratórios, mexem os pulsos e depois a cintura, o pescoço e, no final do período de aquecimento os membros da equipa soltam o grito de guerra, erguem o pesado barco e atiram-no à água, aí esperando até ao tiro de partida.
Divirto-me, junto ao Oceanário de San Sebastián, a observar esta actividade física, enquanto fãs, amigos e familiares incentivam os remadores.
Sociedades gastronómicas na base da honestidade
Em duas longas mesas, numa sala de refeições, os pratos alinhados aguardam os membros da sociedade, enquanto o cozinheiro já vai apurando os sabores e elevando os cheiros do refugado.
De forma imprevista, entro num espaço místico e quase secreto – uma sociedade gastronómica basca. Estas sociedades ou confrarias, são compostas por sócios, cuja principal actividade é a realização de petiscos e jantares.
A entrada é proibida às mulheres em muitas destas sociedades gastronómicas, enquanto noutras as mulheres têm vedada a entrada na cozinha. Questiono-me se não será este o sonho de muitas mulheres – que não lhes seja permitida a entrada na cozinha, seja para cozinhar ou lavar a loiça.
E já agora que os homens passem a ferro, lavem o chão, aspirem e tratem dos filhos. Talvez se criem sociedades também para estas tarefas domésticas? Ou talvez até já existam…
Uma das características principais das tertúlias gastronómicas é que quase tudo é feito de forma voluntária. Por exemplo, um sócio cozinha os produtos levados pelos participantes no petisco.
Outros produtos (como as bebidas alcoólicas) provêm do stock da sociedade, também gerido pelos sócios.
Cada sócio paga uma quota para suportar os gastos comuns, como a limpeza, manutenção ou aquisição de utensílios. Após a realização do evento, deixam-se apontados os gastos e, claro, o dinheiro numa caixa e o tesoureiro fará as contas.
Se a cozinha basca consegue convencer quem viaja desde Portugal, como eu, onde a culinária é um dos pontos que nos define enquanto nação lusa, imagine-se o que faz aos visitantes de países como Inglaterra, Holanda e até França.
Intriga-me que San Sebastián, seja um destino quase ausente das brochuras turísticas nacionais. Talvez a éden culinária do País Basco seja ainda, para nós portugueses, um destino escondido atrás de Barcelona, Madrid, Sevilha ou das Ilhas Canárias.
Donostia a derreter na boca
Talvez San Sebastián se veja num dia, é verdade, se pensasse apenas em Donostia como um somatório de pontos no mapa para visitar. Talvez se pensasse (erradamente) que não existem motivos para ficar mais tempo. Desde que apanhei o comboio nocturno Sud Express até San Sebastián, que prometi não cometer esse erro.
No final deste período queria mais San Sebastián, mais pintxos, mais iguarias da cozinha basca, queria conhecer outros vinhos tintos da região da Rioja – sem sequer ir a essa região de Espanha – ou refrescar-me com um copo extra de Txakoli – o leve vinho donostiarra.
Não consigo cansar-me das vistas a partir do Monte Igueldo, do pôr-do-sol no Paseo Nuevo, nem sequer da água pouco temperada de La Concha.
Só não me sinto a levitar porque ingeri vários (muitos) pintxos. Delicio-me com San Sebastián de manhã à noite. E ainda sinto o sabor daquela tarte de queijo a derreter-se lentamente na língua. Agur San Sebastián.
Informação extra: Visitei San Sebastián no âmbito da minha viagem de longa duração, de comboio, de Portugal a Macau.
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Organizo e lidero viagens em grupo para destinos que conheço bem. E só faço viagens com pequenos grupos (máximo de 12 pessoas).
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